terça-feira, 24 de agosto de 2021

Prisioneiros

"Os prisioneiros

culpados ou não

têm sempre o mesmo ar quando são libertados:

patriarcas destronados.


Aquele acabou de atravessar o portão

de cabeça pendida apesar de não ser alto

gestos como os de um beduíno

ao entrar na tenda

que acartou às costas o dia inteiro.


Cortinas de algodão, paredes de pedra, o cheiro a lima queimada

fazem-no recuar ao momento

em que a guerra fria terminou.


No outro dia penduraram o seu lençol no pátio

como se a ostentar a mancha de sangue

após uma noite de núpcias.


Rostos deslustrados pelo sol

rodeiam-no, só olhos e ouvidos:

«Com que é que sonhaste ontem à noite?»

Os sonhos de um prisioneiro

são pergaminho

sacralizado pelos seus trechos em falta.


A irmã está ainda a descobrir os seus hábitos estranhos:

os pedaços de pão escondidos em bolsos e debaixo da cama

o rachar incessante da lenha para o inverno.


Porquê este medo?

O que poderá ser pior do que a vida na prisão?


Ter escolhas

mas ser-se incapaz de escolher."


Luljeta Lleshanaku

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